sexta-feira, março 30, 2007

vozearia

seguem-se as queixas dos
surdos mudos e quedos
contra as paredes deitados

os abandonados
apresentam
as
suas reclamações
aos chefes
atrás dos balcões
de fórmica castanha

os seguranças
lançam gestos à esquerda e
à direita

os desamparados
explicam as suas dores
às recepcionistas
de costas encurvadas
olhar distraido
voz arranhante

o sol acaba de dar à luz
alguns feixes incandescentes

levantam-se os olhares dos
suplicantes

a vozearia esquecida dos
invisíveis
não encontra eco nas
entranhas dos míseros
intermediários

as mãos páram
os olhos obscurecem-se
as bocas secam de vez

os corpos
mumificam-se
imóveis
nas salas de
espera
das reclamações
não assistidas

arrancam-se os
anéis de
latão
plástico
ouro e prata

perfumam-se as
ambiências de
pó de talco

mais um dia
na inutilidade do
tempo

m.f.s.

1 comentário:

Anónimo disse...

Escolhi:

"mais um dia
na inutilidade do
tempo"