domingo, novembro 30, 2008

 
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cheiros

deambulações histriónicas

os dias permaneciam estampados nos vidros das janelas
em mutações atmosféricas com riscos de aviões super-sónicos
no écran do infinito azul

mfs

escrito vadio

não se lembrava da cor da sua pele atrás das orelhas
só um vislumbre do verde aquoso dos olhos redondos
lhe acenavam do fundo da memória longa de muitos anos
sabia que os cabelos tinham maciezas de nuvens
os dedos eram suaves e firmes quando lhe seguravam a mão

ainda acreditava que saberia reconstruir-lhe o rosto
numa tarde de rosas oferecidas em louca correria

mfs

sábado, novembro 29, 2008

maman

 
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sexta-feira, novembro 28, 2008

o homem

o homem do sobretudo bamboleante contra as luzes da noite
bebe algo bem conhecido que não publicitarei jamais
anseia no seu andar rápido pelo abandono às visões fragmentadas
da sua madrugada

na sua frente a holografia entristecida do seu remorso
desfaz-se e refaz-se em cores de néon encomendado
estilhaços de lembranças em avalanches
reflectidas na garrafa de produto não publicitado

o homem está só como sempre esteve sem corações onde se abrigar
sem conversas de cabeceira
nem toalhas partilhadas
sem talheres acompanhados à mesa da sala imutável
sem o cão o gato o periquito da comunidade familiar
sem comandos de televisão de mão em mão com protestos

o homem não entende o seu mapa
a hidrografia da sua origem
a fragilidade da sua força
as muralhas no seu caminho
por serras desabitadas


mfs

saia amarela

concordar com as ranhuras nas paredes
os filamentos esfarrapados estampados
no chão da minha certitude de esmalte
o alfinete de peito sorumbático
enfiado no alto da manga de malha
as meias grossas confortáveis
negras de lã esmerada sobre os tornozelos delicados

sapatos ah sapatos com sola de borracha silenciosa
nos corredores dos prédios a abater
sapatos atanados de atilhos bem apertados
saia de bombazina amarela
camisola grossa de gola alta
imagine-se de que cor

desenhar sobre as ranhuras rostos amáveis
declarações de amor ao henrique I love you
obscenidades inocentes vai-te puta de merda
sobre o alfinete de peito um rubi de sangue
extraído do dedo mindinho

mfs

e se

e se os depósitos de lembranças hibernantes
se rompesse e de roldão os desejos se despenhassem
nas ruas ruelas becos praças estradas
mas sobretudo nas veredas das montanhas
ladeadas de pequenas alices e coelhos apressados

se as bolsas de ironias flamejantes que se agarram à nossa pele
deixassem cair as rendas antigas de bilros amareladas
as golas das avós serenamente desfeitas nos jazigos de família
fotografias a sépia de espantados camponeses em piqueniques
bolores coloridos assépticos com imaginadas florações de diamantes

se eu sonhasse a minha sina encurvada no quadro preto da escola
as ambições armazenadas nos armários das hipóteses longínquas
se no meu écran temporal e temporário eu soubesse o desalinho da minha vida
a inutilidade das coisa úteis que nos impedem de tecer lérias e compromissos
a certeza da incertitude certa cabal inevitável amedrontante

se assim fosse
assim não seria


mfs

escrito vadio

abanou a cabeça como se sobre ela pairasse a ave das penas rubras
o bico aberto para dele sairem os galanteadores gorgeios
as asas encurraladas no exíguo corpo de arlequim desviado
patas de garras domesticadas às vezes nas planícies
dentro do burburinho dos anónimos pensadores
corpo nú em modelados músculos
o punho sob o peso do queixo que dos olhos desconhece os vislumbres

abanou os ombros anquilosados nos casacos de fria textura
as comédias de verão desenhando-se paulatinamente
nos acordados sonhos de inverno hibernador
os cabelos em volutas desmanchadas com brilhos de cinza de páscoas
os pés impacientes no cucuruto dos montes sem alentejos
as rochas que pedem permissão para rebolarem pelas encostas

estacou na vitrina embaciada do café provinciano
em praceta vaidosa de repuxos municipais eleitoralistas
desviou a mente os olhos as mãos todo o periclitante corpo
da tentação do recanto aconchegador dos braços estendidos
da mãe morta há vinte anos nos brasis interiores

apagou-se o reflexo no vidro rachado dos olhares curiosos
e assim partiu o sebastião esperado o holandês voador atracado
na aldeia cheia de túlipas roxas os bandarras calados enfim


mfs

quinta-feira, novembro 27, 2008

coisa sem nome

o que me salva em muitas situações é acreditar naquela coisa sem nome a quem posso dizer tudo
que sabe como sou

cisco

tenho um "cisco" permanente no olho direito desde há alguns dias
e às vezes vejo tudo enevoado

bahhh

pintor

começou o frio e já liguei o aquecedor

ontem no alfarrabista adquiri um livro sobre um dos grandes pintores portugueses da actualidade

há muitos anos quando o reencontrei era uma pessoa amarga por não ter o reconhecimento a que se julgava com direito

é um óptimo técnico

as suas pinturas e gravuras têm frequentemente referências a outros pintores

como analisar isto?

o melhor é calar-me arrisco-me a qualquer coisa de desagradável se descobrissem a minha opinião

quarta-feira, novembro 26, 2008

hoje

fui comprar sementes para as cearas como costumava fazer há uns anos
veremos se elas grelam e crescem bonitos verdes




também comprei bolbos de jacintos que este ano adquiri mais tarde que o costume




andei a divagar pela baixa espreitando enquadramentos para fotografar
não fiz nada de especial


estes andares degradados davam um belo atelier e casa de habitação
talvez quando reencarnar...

queria comprar um wok mas contive-me
ainda não há percloreto de ferro na drogaria habitual
há meses que não têm
e eu a precisar para fazer gravura em cobre no atelier

terça-feira, novembro 25, 2008

gotas

visto do autocarro



escrito vadio

se calhar já editei isto aqui...
ora


sempre que as portas das velhas janelas rangem
empurradas pelos ares agitados das fendas no espaço
as minhas pálpebras deixam-se cair como estores que
se cerram aos guinchos exteriores

o meu vestido de algodão azul cerúleo
esmorece

as minhas chinelas de corda e pano amarelo
parecem mais apertadas

a revista sobre o sofá encosta-se no braço recoberto
a fotografia do escritor de rosto chupado como ramsés
na capa
pull-over alvo
camisa aos quadradinhos
braços cruzados

no meu mundo físico interior começam a ressoar
os sons estendidos na rua antiga
sons que se elevam atrevidos até aos meus ouvidos
cansados

largo o computador para comer morangos
arrefecidos em excesso pelo frigorífico
em 3.ª ou 4.ª mão do anterior locatário

penso que existir é um tal desperdício
uma inutilidade os brincos nas orelhas
as dores de costas
os calos nos dedos pequeninos dos pés largos e inchados

as janelas rangentes
resmunguices de velhas madeiras empenadas
como as minhas ancas

mfs

gatafunhagens

gosto destas gatafunhagens
sem sentido
aparentemente
subtilezas
só perceptíveis para alguns
o que faço não é para multidões
a maior parte das vezes é só para mim
para me entender
o que não interessa a mais ninguém

consumismo

pelo prazer


made in china

segunda-feira, novembro 24, 2008

crepúsculo








no crepúsculo gosto de fotografar o telhado do prédio da frente e o céu
já fiz inúmeras fotografias
ficam muito granuladas
às vezes faço colagens
ficam com aspecto fantasmagórico

escrito vadio

nas manhãs despenhadas
vejo o cintilar
das coisas invisíveis
que correm pelos caminhos de
terras
vermelhas
vejo as linhas emaranhadas dos
destinos incompletos
vejo-te esmaecida sombra do
meu sonho

pairas como uma pena levada pelas
brisas de verão
transformadas em fios de
ariadne
no labirinto das
contemplações

mfs

domingo, novembro 23, 2008

vou apagar as luzes e rasgar as trevas
a minha pele é uma teia de fios rosados com gotas de sangue
encho-me de silêncio
escondo-me na invisibilidade
desejo dissolver-me
ao início da noite a minha casa exala perfumes em certas zonas
não sei porquê
 
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época consumista

 
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antiguidade

 
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velhos






INVOCAÇÃO


Ó velhos, vós que como os gatos vêdes no escuro
o que as crianças escondem, a distância
por dentro do silêncio, dai-me hoje
lembranças da doçura das manhãs de Julho
e dos vivos crespúsculos de Agosto.

Velhos, divinos velhos, como esquecer-vos?
E às vossas manhãs curtidas nas pedras dos rios
nas noites sinceras de luar?
Que sois cautos nos afectos ao tempo presente
e audaciosos no modo como interpelais fantasmas
numa cisma de amor, numa recriminação,
há muito o aprendi.
E sei que por detrás das vossas humildes máscaras
guardais ainda o segredo das rasteiras ao destino,
do lançar pedras contra os vidros do desalento.

Velhos, quem sois, onde estais? Porque vos escondeis?
Avançai, não temais o néon da incompreensão,
avançai por aqui, até ao proscénio do poema
senhora hortaliceira, senhor tanoeiro,
honrada leiteira, orgulhoso picheleiro;
funileiro e homem de contas
e, tu, ó habitante da mansarda,
entre os sós, poeta romântico.
Todos vós outrora fostes mui respeitados
e se agora, à distância de um postigo,
apenas criais laços com gatos,
pardais, nuvens e morreis pela calada,
tal não é verdadeiramente culpa vossa.

Por vezes, julgais ter errado todos os propósitos
de amor, com a excepção de um cão, um neto
ou um amor enquistado na memória;
qual o grau de verdade nisso não o sei.
Seja como for, este outro convite vos faço:
vinde hoje comigo fazer um carro de rolamentos,
pegar na gancheta, empurrar o arco, rua abaixo;
perscrutar as macieiras e as mãos da mãe
penteando o cabelo.

Como eu, muitos de vós, madrugais
para esperar o céu, um sereno fio de palavras,
a chegada do verão à praia da infância,
e aí nos rendermos ao culto de respirar
junto às rochas o iodo de deus.
Enquanto outros o fazem ao modo vareiro,
dando de comer a um periquito,
rejubilando com o caminho
que ainda têm para trás.

Ladinos, ó como sois ladinos, a reconhecer
a contrafacção dos risos dos netos,
que ainda assim cobris de lambarices e mesadas.
Velhos, soberanos escorraçados da beleza,
ouço-vos, falai comigo, ó meus amigos do coraçàlo,
pois sois peritos, mestres,
do meu país a riqueza inestimável.

Jorge Gomes Miranda
VELHOS
Teatro de Vila Real
2008


Alegre é o olhar e o sorriso
dos velhos
quando as suas mãos ainda conseguem voar
para a construção dos jogos da vida
ou quando se abeiram dos jardins e do rio
e ali permanecem
distantes e quietos
entre as árvores e os pássaros

António Cardoso Pinto
Ou Mundo futuro do tempo...
A Lua Dos Astronautas Não É A Minha Lua
Gradiva
1999


há nos olhos dos velhos hirtos
de sorriso malicioso
nuvens ao redor das pupilas

manchas castanhas
plantam-se-lhes na pele
enrugada e macia

a pele dos velhos é suave
como seda fina amarfanhada
e cheira às cores do infinito

m.f.s.


Velhos

Morrem de olhos abertos,
lançando as últimas faíscas sobre as montanhas
abrem bocas enormes de peixes sem ar
correm-lhes os cabelos pelas faces espantadas
pequenos regatos sulcam a pele rugosa dos rostos
as mãos encarquilham-se em curvas mal desenhadas
cheiram a rosas murchas sobre as camas
nenhuma cor lhes pinta a roupa
despedem-se a preto e branco

m.f.s.

sábado, novembro 22, 2008

céus

sexta-feira, novembro 21, 2008

Boaventura de Sousa

AUTO-RETRATO

Este retrato tem barulho de escada rolante
que se cala em movimento

o chão dos achados
rodeia o mapa de flores pesadas
e os degraus germinam nos pés
à cata de gente média
passageira imóvel dos factos

cresce com o excesso latino
a morte vitalícia de um céu mecânico

a espera é d'aço menino
como um século corporal
vestido de santos e arcanjos
entre os pardais da cama

os troféus escondem os donos
e pensam grosso à sobremesa

sou um homem casado
com dois ou três princípios
que não têm fim.

Boaventura de Sousa
Madison e Outros Lugares
Edições Afrontamento
1989

escrito

graves borboletas se deitam no espanto
ouvem nas gotas da chuva um suave canto

loucas libelinhas levitam nos pântanos
bebem a água turva dos terrosos cântaros

meninas-aves gorjeiam nas tardes trovejantes
enfeitam os cabelos de aquosos diamantes

os olhos sem rosto velados de brumas
ganham brilhos de vidro nascido de espumas

mfs

escrito

o sangue que se derrama lentamente
sobre as mãos de mármore branco

as sombras que se despenham
sobre a brancura das cabeças de pedra

as linhas oscilantes das ervas
que se projectam contra as paredes

as brisas que levantam o silêncio
e levam os odores vegetais em redemoinhos

o jardim que espreguiça as suas cores
sob uma cúpula de intenso azul celeste

a leveza do voo dos insectos fecundadores
as sementes que rodopiam

a possibilidade de ser terra

um dia

mfs

quinta-feira, novembro 20, 2008

Navajos

ÁGUA

A água correndo, essa água correndo!
Atravessou-a o meu espírito.
A água vasta, essa água correndo!
Atravessou-a o meu espírito.
A água antiga, essa água correndo!
Atravessou-a o meu espírito.

América do Norte, Navajos
Rosa do Mundo - 2001 Poemas para o Futuro
(versão de Herberto Helder)

Rade Drainac

FOLHA

Mudei de estação: o Outono ficou para trás e as minhas malas.
Agora o céu é duvidoso, como uma mentira inábil.
Na primeira taberna terei de esquecer
A carta melancólica que me tirou o sono.
Ocioso, arrasto-me pela rua, entre escritórios.
As andorinhas partiram e as máquinas de escrever ficaram.
No horizonte há uma grande trombeta de fumo.
Foi há pouco inventado um avião tão pequeno como uma borboleta.
Bravo! É um bom sinal.
A primeira folha de Outono cai no meu chapéu.

Rade Drainac
(1899-1943)
Sérvia
TRAD.:José Alberto Oliveira
ROSA DO MUNDO
2001 poemas para o futuro
Assírio & Alvim
3ª edição
2001

terça-feira, novembro 18, 2008

regresso?



regresso?
talvez

não tenho escrito praticamente nada
estou no limbo e não me apetece sair

ando às voltas com uma gravura de que tenho de tirar 20 provas um record para a minha paciência

entretanto saíu o novo indy com o nome de minha filha na ficha técnica
mãe vaidosa sim senhor