quarta-feira, dezembro 31, 2008

de longe

lá de longe a minha filha vai-me telefonando
ontem de singapura
hoje do bornéu
preocupada com o meu problema da vista
insiste para ir a outro oftalmologista

sábado, dezembro 27, 2008

natal

o natal já lá vai e correu muito bem

agora vem aí o ano novo
o espumante
as passas
os desejos
o fogo de artifício na televisão

o frio

contudo no último natal que passei com os meus primos antes deste
a salamandra esteve sempre acesa
este ano não foi preciso

falei com a minha filha
vi os vídeos do natal dela e do marido
enviei-lhe um vídeo que fiz e demorou horas a chegar pelo messenger
recebi um vídeo de natais passados

foi bom

agora estou no quentinho

sexta-feira, dezembro 26, 2008

gravuras de natal da galeria diferença


fernanda frança garrido


Rita Gamboa


Paulo Lourenço


Maria Figueira da Silva


Fernanda Pissarro


Rosa Lança


Sollari


Maria Celeste Guia

quarta-feira, dezembro 24, 2008

é isso


divirtam-se

na oftalmologista




deitou-me umas gotas amarelas no olho direito
tinha lá dentro uma pestana que me incomodava e não conseguia tirar
a pupila foi-se dilatando
dilatando
dilatando
parecia um daqueles et que ficam com os olhos negros para assustar os medrosos

ontem






ontem na confusão dos transportes públicos a minha empregada romena foi assaltada
lá se foram os ganhos do dia e o subsídio de natal
não tinha com quem falar
então telefonou-me chorosa

fui à oftalmologista
cuidados especiais
por enquanto não é preciso tratamento a laser

entre espera e consulta foram 2h 30m
li revistas bilhardeiras antigas
fotografei a sala de espera
fotografei a avenida

suspirei

quando finalmente saí ia embatendo numa esguia criatura que me deve ter insultado numa língua desconhecida
£§@€{[]

em casa tinha uma chamada não atendida e pouco depois duas chamadas simultâneas no fixo e no móvel
boas festas me desejavam

obrigada
the same to you

terça-feira, dezembro 23, 2008

mercado


euforias natalícias


o televisor arde


ontem fui ao pão de açúcar das amoreiras
caríssimo
mas tem umas refeições preparadas baratas
da aucham
têm várias vantagens
são pequenas
sabem bem
não se suja a louça excepto os talheres e copo
ora
come-se menos que o habitual
bom para dietas
acho

porcas e parafusos

fotografia

estou sem inspiração nenhuma para fazer fotografias
repito-me
repito-me
preciso de mais empenho
oxalá as festas passem depressa
é o 2.º ano sem a minha filha

gosto muito da palavra oxalá
parece que nos conduz mais além
não sei para onde
mas é bonito o sítio
seja ele qual for

normalidade

regresso à normalidade
mais ou menos

a minha empregada romena no seu estropiadíssimo português de 4 anos neste país
contou-me que sonhou que eu tinha morrido
estava no caixão toda de preto
havia muita gente e muitas flores
antes de morrer tinha-a chamado para perto de mim e colocado a mão dela sobre o meu peito
acordou aflita a transpirar eram 3 horas da manhã

ontem comprei o livro "experiências de quase morte" e li alguns relatos de pessoas que quase foram para o outro lado
tive uma experiência desse género só que estava suspensa na escuridão
sentia-me muito confortável e não queria sair do não sítio

o natal vai ser como dantes
sem a presença principal que nos deixou este ano

hoje vou à galeria buscar a caixa de gravurinhas que me coube
tenciono colocá-las aqui

domingo, dezembro 21, 2008

escrito

os homens não fazem a barba desde o luto
e sobre os cabelos emaranhados depositaram cinzas
constroem armadilhas para as aranhas fugidas dos ninhos

bebem águas tintas de desgostos
enrolam lenços diáfanos nos pescoços
cintos sem fivelas de vidros resplandescentes
sobre as ancas

os homens ainda não sabem chorar
e as teias dos inimigos enlaçam-lhes os tornozelos
recolhem nas mãos arroxeadas
o ar que lhes sai dos pulmões cansados

esquecem as aranhas e as teias
as cinzas os desgostos as fivelas
fecham os olhos amarelecidos pelo olvido

os homens
ainda
não sabem
chorar

mfs

domingo, dezembro 14, 2008

la maladie -I

a temperatura desceu para 35.8
devo estar quase com hipotermia

salvo seja

hoje de novo a voz da filha lá de singapura
preocupada

ponho-me a ver televisão
hugh grant e a barrymore do e.t.
uma patetice
a 1ª vez que o vi foi em maurice de que gostei muito
daí para cá nunca mais lhe achei grande piada

vou descansar
não tenho feito outra coisa

sábado, dezembro 13, 2008

la maladie

a febre ora sobe ora desce
o corpo padece dores paralisantes
aspirina antibiótico vitaminas além das drogas habituais
vive-se artificialmente
ainda bem
procuro recrutar paciência da que ainda me resta

entretenho-me a ver o novo canal
heróis e bandidos voadores
corpos que rebolam no ar em múltiplas reviravoltas
cabeleiras loiras
olhos de gatos
um dos bandidos quase réplica de andy wharhol
poderes especiais
divirto-me um pouco com isto

e a gata que não me larga o colo

mail para filha
estou doente
telefonema da filha
então
já foste ao médico
cuida de ti
olha estou a arranjar-me para a festa de natal da empresa
mais de 300 pessoas
depois mando-te fotos
quanto ao projecto do sebastianito já adiantei um pouco
mas há agora outro mais interessante
se calhar desisto de sebastião que o tempo não dá para tudo

tão bom ouvir a voz da filhota


http://forums.cgsociety.org/showthread.php?f=278&t=698975

quinta-feira, dezembro 11, 2008

Casimiro de Brito

Se eu pudesse deixar de correr
Caminhava se eu pudesse deixar de caminhar
Sentava-me à sombra da nogueira azul do céu
Se eu pudesse deitar-me deitava-me
Numa cova com a forma do meu corpo em
Repouso se eu pudesse deixar de cantar
Fechava os olhos e olhava o alto vazio
Onde não acontece nada a não ser
A conciliação provisória do caos
E da luz que não se cansa de nascer.



Casimiro de Brito
Na Via Do Mestre

domingo, dezembro 07, 2008

blue velvet


Blue Velvet - Bobby Vinton - The best video clips are here

João Camilo

NA AREIA HÚMIDA

A solidão verdadeira, quando a conhecerei de novo?
Vejo-me caminhar à beira da água, embebido em mim mesmo.
Os meus pés deixam marcas na areia húmida, o meu cabelo
esvoaça suavemente ao vento do outono, brisa vinda de longe.
De mãos nos bolsos, eu sei que me afastei de tudo, do meu
destino e das cidades, dos pais e dos filhos que me couberam
para que também eu conhecesse o peso das palavras e do tempo.
Praia do Norte que chamas por mim, floresta densa
coberta de neve, quando virá enfim a manhã de novembro,
quando poderei caminhar na tua areia ensopada de sal?
Na véspera terei posto uma cruz nos dias que faltam
para que o mês termine. O sucesso da minha existência
terá deixado de interessar-me. De manhã saí de casa, era cedo,
como se fosse ao encontro da morte que espera por nós
na luz pálida de um dia igual aos outros.

João Camilo
A Mala dos Marx Brothers
Caminho
Da Poesia

sábado, dezembro 06, 2008

sexta-feira, dezembro 05, 2008

al berto

Horto


homens cegos procuram a visão do amor
onde os dias ergueram esta parede
intransponível

caminham vergados no zumbido dos ventos
com os braços erguidos - cantam

a linha do horizonte é uma lâmina
corta os cabelos dos meteoros - corta
as faces dos homens que espreitam para o palco
nocturno das invisíveis cidades

escorre uma linfa prateada para o coração dos cegos
e o sono atormenta-os com os seus sonhos vazios

adormecem sempre
antes que a cinza dos olhos arda
e se disperse

no fundo do muito longe ouve-se
um lamento escuro
quando a alba se levanta de novo no horto
dos incêndios

prosseguem caminho
com a voz atada por uma corda de lírios
os cegos
são o corpo de um fogo lento - uma sarça
que se acende subitamente por dentro.


Al-Berto
Horto do Incêndio

quinta-feira, dezembro 04, 2008

ai ai

soube ontem que a colectiva em que entrei no Porto esteve em Tóquio e agora está em Amesterdão
olhem como estou contentinha
ora

ontem





leilão de arte no hotel real palace a favor de pessoas com necessidades especiais

lá estavam uma fotografia e uma gravura minhas

terça-feira, dezembro 02, 2008

mulheres afegãs

Meu amor, vai vingar o sangue dos mártires
Antes de mereceres o refúgio dos meus seios

Possas tu morrer no campo da honra, meu amado
Para que as moças cantem a tua glória quando forem buscar
água à fonte

Ó meu amor, se nos meus braços tremes tanto
Que farás quando do choque das espadas saltarem mil faíscas?

Hoje, durante a batalha, o meu amante voltou as costas ao
inimigo
Sinto-me humilhada por tê-lo beijado ontem à noite

Regressa crivado de balas dum tenebroso fuzil
Coserei as tuas feridas e te darei a minha boca

Ó bem-amado! Se voltares as costas ao inimigo, não regresses
Vai procurar refúgio num país distante


A Voz Secreta das Mulheres Afegãs
O Suicídio e o Canto
Versão de Ana Hatherly
cavalo de ferro

segunda-feira, dezembro 01, 2008

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Luiza Neto Jorge

DIFÍCIL POEMA DE AMOR


Separo-me de ti nos solstícios de verão, diante da mesa do juiz supremo
dos amantes. Para que os juízes me possam julgar, conhecerão primeiro o
amor desonesto infinito feito de marés ambulantes de espinhos nas pálpebras
onde as ruas são os pontos únicos do furor erótico e onde todos os pontos
únicos do amor são ruas estreitíssimas velocíssimas
que se percorrem como um fio de prumo sem oscilação.

Ontem antes de ontem antes de amanhã antes de hoje antes deste
número-tempo deste número-espaço uma boca feita de lábios alheios beijou.
Precipício aberto: ele nada revela que tu já não saibas.
Porque este contágio de precipícios foste tu que mo comunicaste
maléfico como um pássaro sem bico.

Num silêncio breve vestiu-se a cidade. Muito bom-dia querido
moribundo. Sozinho declaraste a terceira grande paz mundial quando abrindo
os olhos me deste de comer cronometricamente às mil e tantas horas da
manhã de hoje.

Deito-me cedo contigo o meu sono é leve para a liberdade acordas-
-me só de pensares nela. As casas e os bichos apoiam-se em ti. Não fujas não
te mexas: vou fixar-te para sempre nessa posição.
.
Que há? Abrem-se fendas no ar que respiro vejo-lhe o fundo. Tens os
olhos vasados. Qual de nós os dois "quero-Te" gritou?

Bebe-me espaçadamente encostada aos muros. Se és poeta que fazes tu?
Comes crianças jogas ases sentado és uma estátua de pé a cauda de um cometa.

Mães entretanto vão parindo. Os filhos morrerão ainda? Entregas-te a
cálculos. Amas-me demais.
Confesso: não sei se sou amada por ti.

Virás
quando houver uma fala indestrutível devolvida à boca dos mais vivos. Então
virás
vivo também. Sempre esperei ver-te ressuscitado. Desiludiste-me.

E iremos com o plural de nós nos leitos menores onde o riso, onde o
leito do rio é um filho entre os dois. Que farei de teus braços de meus cabelos
benignos que faremos?

Nasci-te da minha pele com algumas fêmeas te deitei por vezes.
Conheces-me. Não me tens amor

Grave esta corda cortada agudo seixo me ataste aos olhos para me
afundar.

Só por grande angústia me condenas à morte se de mim te veio a cidade
e os minúsculos objectos que já amaste ou que irás amar um dia espero.
Ah a cratera o abismo eléctrico!

Por isso o teu novo amor será comigo mais perigoso que este imaculado
com mais visco de amor cópula mortal.

Calo-me.
Reparei de repente que não estavas aqui. Pus-me a falar a falar. Coisas
de mulher desabitada. Sei que um dia desviarei sem ti os passeios rectos
esvaziarei os gordos manequins falantes. A razão é uma chapa de ferro
ao rubro: se acredito na tua morte começo o suicídio.

Enquanto penetrantemente te espero a luz coalhou. Os pássaros
coalharam enquanto te espero. O leite enquanto te espero coalhou. Haverá
outro verbo?
Submersa, muito distante de qualquer inferno de um paraíso qualquer existo
eu. Existirão tais palavras?

É a altura de escrever sobre a espera. A espera tem unhas de fome, bico
calado, pernas para que as quer. Senta-se de frente e de lado em qualquer
assento. Descai com o sono a cabeça de animal exótico enquanto os olhos se
fixam sobre a ponta do meu pé e principiam um movimento de rotação em
volta de mim em volta de mim de ti.

Nunca te conheci - assim explico o teu desaparecimento. Ou antes:
separei-me de ti no solstício de um verão ultrapassado. As mulheres viajavam
pela cidade completamente nuas de corpo e espírito. Os homens mordiam-
-se com cio. Imperturbável pertenceste-me. Assim nos separámos.

Não calhasse morrer um de nós primeiro que o outro porque ambos ao
mesmo tempo será impossível enquanto não houver relógios que meçam
este tempo e as horas fielmente se adiantarem e atrasarem.

Alguma vez pretendi dizer-te o que quer que fosse? Falava por paixão
por tibieza por desgosto por claridade por frio por cansaço

nunca por pretender dizer o que quer que fosse.

Não me desculpo. Se já me cai o cabelo se já não sinto os ombros é
porque o amor é difícil ou a minha cabeça uma pedra escura que carrego
sobre o corpo a horas e desoras ostentando-a como objecto público sagrado
purulento. O odor que as pedras têm quando corpos. O apocalipse de tudo
quando amamos. O nosso sangue em pó tornado entornado.

O teu amor espreita o meu corpo de longe. De longe por gestos
lhe respondo. Tenho raízes nos vulcões ternuras íntimas medos reclu-
-sos beijos nos dentes.

A pobreza surge dentro de nós embora cautelosos deitados de manhã e
de tarde ou simplesmente de noite despertos. Ambos meu amigo estamos
sentados neste momento perfeitamente incautos já. Contemplamos um país
e sentamo-nos e vestimo-nos e comemos e admiramos os monumentos e
morremos.

Inventei a nossa morte em toda a impossível extensão das palavras.
Aterrorizei-me segundos a fio enquanto em corpo nu ouvindo-me ador-
-mecias devagar.

Com a precaução de quem tem flores fechadas no peito passeei de noite
pela casa. Um fantasma forçou uma porta atrás de mim. Gemendo como um
animal estrangulado acordei-te.

Enterro o meu terror como um alfange na terra. Porque é preciso ter
medo bastante para correr bastante toda a casa celebrar bastantes missas negras
atravessar bastante todas as ruas com demónios privados nas esquinas.

Só o amor tem uma voz e um gesto mesmo no rosto da ideia que me
impus da morte.
És tu tão único como a noite é um astro.

Sobre a poeira que te cobre o peito deixo o meu cartão de visita o meu
nome profissão morada telefone.

Disse-te: Eis-me.
E decepei-te a cabeça de um só golpe.

Não queria matar-te. Choro. Eis-me! Eis-me!


Luiza Neto Jorge
Difícil Poema de Amor
poesia
organização e prefácio de
Fernando Cabral Martins
Assírio & Alvim
2ª edição
2001

domingo, novembro 30, 2008

 
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cheiros

deambulações histriónicas

os dias permaneciam estampados nos vidros das janelas
em mutações atmosféricas com riscos de aviões super-sónicos
no écran do infinito azul

mfs

escrito vadio

não se lembrava da cor da sua pele atrás das orelhas
só um vislumbre do verde aquoso dos olhos redondos
lhe acenavam do fundo da memória longa de muitos anos
sabia que os cabelos tinham maciezas de nuvens
os dedos eram suaves e firmes quando lhe seguravam a mão

ainda acreditava que saberia reconstruir-lhe o rosto
numa tarde de rosas oferecidas em louca correria

mfs

sábado, novembro 29, 2008

maman

 
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sexta-feira, novembro 28, 2008

o homem

o homem do sobretudo bamboleante contra as luzes da noite
bebe algo bem conhecido que não publicitarei jamais
anseia no seu andar rápido pelo abandono às visões fragmentadas
da sua madrugada

na sua frente a holografia entristecida do seu remorso
desfaz-se e refaz-se em cores de néon encomendado
estilhaços de lembranças em avalanches
reflectidas na garrafa de produto não publicitado

o homem está só como sempre esteve sem corações onde se abrigar
sem conversas de cabeceira
nem toalhas partilhadas
sem talheres acompanhados à mesa da sala imutável
sem o cão o gato o periquito da comunidade familiar
sem comandos de televisão de mão em mão com protestos

o homem não entende o seu mapa
a hidrografia da sua origem
a fragilidade da sua força
as muralhas no seu caminho
por serras desabitadas


mfs

saia amarela

concordar com as ranhuras nas paredes
os filamentos esfarrapados estampados
no chão da minha certitude de esmalte
o alfinete de peito sorumbático
enfiado no alto da manga de malha
as meias grossas confortáveis
negras de lã esmerada sobre os tornozelos delicados

sapatos ah sapatos com sola de borracha silenciosa
nos corredores dos prédios a abater
sapatos atanados de atilhos bem apertados
saia de bombazina amarela
camisola grossa de gola alta
imagine-se de que cor

desenhar sobre as ranhuras rostos amáveis
declarações de amor ao henrique I love you
obscenidades inocentes vai-te puta de merda
sobre o alfinete de peito um rubi de sangue
extraído do dedo mindinho

mfs

e se

e se os depósitos de lembranças hibernantes
se rompesse e de roldão os desejos se despenhassem
nas ruas ruelas becos praças estradas
mas sobretudo nas veredas das montanhas
ladeadas de pequenas alices e coelhos apressados

se as bolsas de ironias flamejantes que se agarram à nossa pele
deixassem cair as rendas antigas de bilros amareladas
as golas das avós serenamente desfeitas nos jazigos de família
fotografias a sépia de espantados camponeses em piqueniques
bolores coloridos assépticos com imaginadas florações de diamantes

se eu sonhasse a minha sina encurvada no quadro preto da escola
as ambições armazenadas nos armários das hipóteses longínquas
se no meu écran temporal e temporário eu soubesse o desalinho da minha vida
a inutilidade das coisa úteis que nos impedem de tecer lérias e compromissos
a certeza da incertitude certa cabal inevitável amedrontante

se assim fosse
assim não seria


mfs

escrito vadio

abanou a cabeça como se sobre ela pairasse a ave das penas rubras
o bico aberto para dele sairem os galanteadores gorgeios
as asas encurraladas no exíguo corpo de arlequim desviado
patas de garras domesticadas às vezes nas planícies
dentro do burburinho dos anónimos pensadores
corpo nú em modelados músculos
o punho sob o peso do queixo que dos olhos desconhece os vislumbres

abanou os ombros anquilosados nos casacos de fria textura
as comédias de verão desenhando-se paulatinamente
nos acordados sonhos de inverno hibernador
os cabelos em volutas desmanchadas com brilhos de cinza de páscoas
os pés impacientes no cucuruto dos montes sem alentejos
as rochas que pedem permissão para rebolarem pelas encostas

estacou na vitrina embaciada do café provinciano
em praceta vaidosa de repuxos municipais eleitoralistas
desviou a mente os olhos as mãos todo o periclitante corpo
da tentação do recanto aconchegador dos braços estendidos
da mãe morta há vinte anos nos brasis interiores

apagou-se o reflexo no vidro rachado dos olhares curiosos
e assim partiu o sebastião esperado o holandês voador atracado
na aldeia cheia de túlipas roxas os bandarras calados enfim


mfs

quinta-feira, novembro 27, 2008

coisa sem nome

o que me salva em muitas situações é acreditar naquela coisa sem nome a quem posso dizer tudo
que sabe como sou

cisco

tenho um "cisco" permanente no olho direito desde há alguns dias
e às vezes vejo tudo enevoado

bahhh

pintor

começou o frio e já liguei o aquecedor

ontem no alfarrabista adquiri um livro sobre um dos grandes pintores portugueses da actualidade

há muitos anos quando o reencontrei era uma pessoa amarga por não ter o reconhecimento a que se julgava com direito

é um óptimo técnico

as suas pinturas e gravuras têm frequentemente referências a outros pintores

como analisar isto?

o melhor é calar-me arrisco-me a qualquer coisa de desagradável se descobrissem a minha opinião

quarta-feira, novembro 26, 2008

hoje

fui comprar sementes para as cearas como costumava fazer há uns anos
veremos se elas grelam e crescem bonitos verdes




também comprei bolbos de jacintos que este ano adquiri mais tarde que o costume




andei a divagar pela baixa espreitando enquadramentos para fotografar
não fiz nada de especial


estes andares degradados davam um belo atelier e casa de habitação
talvez quando reencarnar...

queria comprar um wok mas contive-me
ainda não há percloreto de ferro na drogaria habitual
há meses que não têm
e eu a precisar para fazer gravura em cobre no atelier

terça-feira, novembro 25, 2008

gotas

visto do autocarro



escrito vadio

se calhar já editei isto aqui...
ora


sempre que as portas das velhas janelas rangem
empurradas pelos ares agitados das fendas no espaço
as minhas pálpebras deixam-se cair como estores que
se cerram aos guinchos exteriores

o meu vestido de algodão azul cerúleo
esmorece

as minhas chinelas de corda e pano amarelo
parecem mais apertadas

a revista sobre o sofá encosta-se no braço recoberto
a fotografia do escritor de rosto chupado como ramsés
na capa
pull-over alvo
camisa aos quadradinhos
braços cruzados

no meu mundo físico interior começam a ressoar
os sons estendidos na rua antiga
sons que se elevam atrevidos até aos meus ouvidos
cansados

largo o computador para comer morangos
arrefecidos em excesso pelo frigorífico
em 3.ª ou 4.ª mão do anterior locatário

penso que existir é um tal desperdício
uma inutilidade os brincos nas orelhas
as dores de costas
os calos nos dedos pequeninos dos pés largos e inchados

as janelas rangentes
resmunguices de velhas madeiras empenadas
como as minhas ancas

mfs

gatafunhagens

gosto destas gatafunhagens
sem sentido
aparentemente
subtilezas
só perceptíveis para alguns
o que faço não é para multidões
a maior parte das vezes é só para mim
para me entender
o que não interessa a mais ninguém

consumismo

pelo prazer


made in china

segunda-feira, novembro 24, 2008

crepúsculo








no crepúsculo gosto de fotografar o telhado do prédio da frente e o céu
já fiz inúmeras fotografias
ficam muito granuladas
às vezes faço colagens
ficam com aspecto fantasmagórico

escrito vadio

nas manhãs despenhadas
vejo o cintilar
das coisas invisíveis
que correm pelos caminhos de
terras
vermelhas
vejo as linhas emaranhadas dos
destinos incompletos
vejo-te esmaecida sombra do
meu sonho

pairas como uma pena levada pelas
brisas de verão
transformadas em fios de
ariadne
no labirinto das
contemplações

mfs

domingo, novembro 23, 2008

vou apagar as luzes e rasgar as trevas
a minha pele é uma teia de fios rosados com gotas de sangue
encho-me de silêncio
escondo-me na invisibilidade
desejo dissolver-me
ao início da noite a minha casa exala perfumes em certas zonas
não sei porquê