sempre que as portas das velhas janelas rangem
empurradas pelos ares agitados das fendas no espaço
as minhas pálpebras deixam-se cair como estores que
se cerram aos guinchos exteriores
o meu vestido de algodão azul cerúleo
esmorece
as minhas chinelas de corda e pano amarelo
parecem mais apertadas
a revista sobre o sofá encosta-se no braço recoberto
a fotografia do escritor de rosto chupado como ramsés
na capa
pull-over alvo
camisa aos quadradinhos
braços cruzados
no meu mundo físico interior começam a ressoar
os sons estendidos na rua antiga
sons que se elevam atrevidos até aos meus ouvidos
cansados
largo o computador para comer morangos
arrefecidos em excesso pelo frigorífico
em 3.ª ou 4.ª mão do anterior locatário
penso que existir é um tal desperdício
uma inutilidade os brincos nas orelhas
as dores de costas
os calos nos dedos pequeninos dos pés largos e inchados
as janelas rangentes
resmunguices de velhas madeiras empenadas
como as minhas ancas
mfs
josé gomes ferreira / heróicas
-
XIX
Ouve, primavera: não te atrevas
a sair das rosas para o mundo.
Não venhas arrepender de beleza fácil
este meu instinto
– tão contra mim –
de morr...
Há 23 horas
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