quinta-feira, março 11, 2010

Ruy Duarte de Carvalho

EXERCÍCIOS DE CRUELDADE

*

As crianças
carregadas de destino
batráquios prisioneiros do pó e da vidraça
alastram no papel o som e a cor dos seus débeis sorrisos.

Arde-lhes já na face
o circunflexo acento do desgosto-
a reprimida força da malícia atenta.

Miram-nos frias do fundo da película-

crescem-lhes dentes de apetite oculto
mandibulam ameaças de domínio
destroem uma a uma
as flores da idade
e cobrem-se escarninhas
de pêlos urticantes.

Exibem unhas curvas
afiadas para a disputa
e denunciam intenções de assalto
na lisa mansidão
com que protegem a morosa espera.

As crianças tiranizam o espaço que atingiram.
Possessas
dilaceram crianças de outras raças -
assumem, rancorosas, o desdém na face
e inquirem
inocentes
se os pretos têm nome.

Ruy Duarte de Carvalho
LAVRA
Poesia reunida 1970/2000
Cotovi

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